Às vezes, penso que não te larguei por pura teimosia, orgulho feminino, aquela mania muito estúpida de pensar que quem nos deixou cair está sempre a tempo de se redimir. Um dia havias de voltar, como fazem os cães, para lamber a mão do dono, os amigos arrependidos ou os irmãos desavindos. Outras vezes, apercebo-me de que não te deixei cair porque me alimentas a veia, és uma droga dura, muito boa, como todas as drogas, mas isso é o que oiço dizer, porque nunca experimentei.(...)
Queria acreditar que te esqueceria quando alguém, finalmente, ocupasse o teu lugar. Mas o coração não é um motor, não lhe podes trocar peças, tirar aquela porque emperrou e substituí-la por esta só porque o faz mais feliz. Ainda tentei esse método, não resultou, encostei à box, ri-me outra vez de mim e descontraí.
E, como reza a história, foi quando desisti de lutar que venci.
O gato nunca mais apareceu, talvez tenha finalmente percebido, tanto tempo depois, que a Alice já não mora aqui. A confusão é o início de uma nova realidade e percebi que sou muito mais feliz num jardim sem gatos pendurados nas árvores, nem coelhos apressados que atiram pessoas para o poço no fundo do qual há uma porta fechada, uma maçaneta que fala e poções que nos fazem ficar mais pequenos ou maiores, consoante o número de gotas.
Agora sou outra vez dona da minha casa e na minha alma vive outro herói que não se pendura nas árvores nem no meu coração, não desaparece, nem troça de mim. Matei a Alice e o gato foi-se embora. Quem sabe, a esta hora, não estará pendurado em qualquer lado a pensar com as suas listas porque é que a história mudou. É que quando o bule de chá explode, nada mais volta a ser igual." MRP
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